Thursday, January 07, 2010

Tour Report II

CILICE
"Havia caixas de ovos nas paredes de cima a baixo"

05/10/2009 - Segunda-feira

Dia inteiro em viagem. Destino: Tallinn, capital da Estónia. Temos a escolher entre duas direcções: São Petersburgo e as suas boas estradas, mas tendo que atravessar o infernal posto de fronteira, ou a cidade de Pskov, passando por zonas onde o asfalto ainda está por inventar. Talvez façamos um próxima digressão numa caterpillar! É que ainda nos facilitava a passagem nas fronteiras. A escolha é óbvia.

Tempo chuvoso, paisagem rural verde-amarelada e montanhosa - um cenário outonal. Passamos por vilas de agricultores onde há maçãs à venda empilhadas ao alto ao longo da estrada. Aproximamo-nos do tráfego. Vem de frente um veículo com os faróis a piscar - polícia. Abrandamos o andamento.

Glórias do passado... realmente tudo aqui está em estado decadente. As habitações, na sua maioria feitas de madeira com telhados de zinco, estão em colapso. O amarelo, verde e azul parece pálido e claramente a precisar de uma pintura. Um emaranhado de tubulações aéreas atravesssam aldeias e cidades. Pobres fábricas de aço, ferrugentas e escurecidas. Os apartamentos nos subúrbios estavam inclinados. Os carpinteiros foram, provavelmente, russos bêbedos. Não acredito que não soubessem nada sobre níveis.

Entretanto, são 22h00. Vamos em direcção à fronteira no meio do escuro e do frio. Gastamos os últimos rublos em combustível. Pelo quarto do preço que pagamos normalmente, é um bom motivo para voltarmos nos próximos anos.

Posto fronteiriço #1: Preencher os habituais formulários, abrir o capot, cães da "droga" novamente. No checkpoint seguinte: passaportes e visas conferidos com muito cuidado.

Uma hora mais tarde encaramos a fronteira com a Estónia. Esperávamos que nos exigissem a quantidade de cigarros e bebidas que trouxemos [apenas algumas garrafas de vodka]. A perspectiva de uma carrinha lotada fez o guarda pensar imediatamente: "Passem"! Wow, foi realmente rápido, demorou apenas uma hora e meia. Chegamos a Tallinn às 00h00. É momento de encontrar sítio para ficar.

06/10/09 - Terça-feira

Pela manhã eu e o Matthias exploramos Tallinn. A velha cidade é cercada por muralhas da cidade antiga e é popular entre os turistas pelas suas torres medievais, velhas casas de comércio e armazéns. Também existem casas de câmbio em todo o lado. Coroas de euros, café e bolos.

De regresso à carrinha, encontramos o resto do pessoal acordado. Preparamos uma Bloody Mary. Lá se vai o presente que ia dar em casa - uma garrafa de vodka. Muito saborosa. O Phillip perdeu o seu casaco. Depois de examinarmos um pouco chegamos à conclusão de que foi roubado. O vidro da carrinha estava provavelmente demasiado aberto e fomos roubados enquanto dormiamos.

Chegamos ao Follow Your Dreams Studios. Um clube? Não, um complexo de salas de ensaio. Chamamos o promotor de serviço. É o nosso último concerto na Estónia e ele garante-nos muito público. Ok, vamos continuar. O espaço era quadrado. Havia caixas de ovos nas paredes de cima a baixo. Fizemos um pequeno teste de som e tudo soa bem. À hora do espectáculo o espaço fica cheio. Entretanto, o Phillip e o Remko mudam o pneu esquerdo traseiro da carrinha.

Chega então a nossa vez de actuar - um math metal instrumental com samples industriais ou algo parecido... Foi um concerto e pêras. Depois disso, travamos conversa com muitas pessoas e com o nosso entusiástico promotor. Seguiu-se o habitual: autografar posters e autocolantes. Entretanto, acontece o inesperado: surgem dois polícias. Ao fim de meia-hora abandonam o local.

Ao fim da noite, o espaço de ensaios dá agora lugar ao nosso "hotel". Sacos-cama, colchões entre os amplificadores, acompanhado de Tom Waits no iPod, uma luz suave, um ambiente relaxante. Boa noite.

07/10/09 - Quarta-feira

Depo, Riga, Letónia. De manhã bem cedo ouvimos o “estrondo” de guitarras vindo de uma das salas de ensaio. É hora das despedidas. Tomamos o pequeno-almoço num centro comercial: galinha e pão. Era o dia de aniversário do Matthias; damos-lhe os parabéns! Brindamos com vodka e sumo de tomate – um paladar “perigoso”.

18h00, Riga. Chegamos. É uma cidade com 800 mil habitantes. É a maior cidade dos Balcãs. Neste caso, sabemos bem o caminho. Já cá estivemos quatro vezes. O clube Depo fica mesmo no lado oposto da rua onde se encontra a nossa residêncial. Tomamos um duche. Estávamos mesmo a precisar.

Depois disso reunimo-nos com os nossos amigos dos Lassie The Cat, banda de metal técnico. Mais bandas estão no nosso alinhamento de suporte. Todas dão grandes espectáculos. A casa está cheia, vêem-se muitos fãs que chamam pelo nosso nome. Para muitos a questão impõe-se: onde está o nosso vocalista? Bom, nós teríamos adorado se ele tivesse vindo. “Problemas familiares no centro da decisão”, explicámos. Os Cilice não cancelam digressões. Acho que merecemos respeito por essa atitude. Pude ver-se mosh violento do princípio ao fim do concerto. Os nossos posters e autocolantes iam desaparecendo rapidamente, bem como o conteúdo das nossas cervejas. O Matthias deitava-se no banco como um feto. O álcool havia tomado conta dele.

08/10/009 - Quinta-feira

Liepaja, Fountaine Palace. Dormimos umas míseras horas. Reunimo-nos pelas 09h00 para carregar o backline para a carrinha. Agora sim, estou acordado; vamos dar uma volta por Riga. Cidade antiga... prédios monumentais, igrejas, casas de câmbio, turistas. Próximo da estação de comboio existe um mercado gigante coberto. Vê-se carne, peixe, roupa, mendigos, velhotas a vender cuecas e peúgos, etc.

Já em Liepaja, a maior cidade portuária do sudoeste da Letónia. Metade dos seus habitantes são russos. Chegamos ao Fountaine Club. É tarde, não uma das mais ocupadas. Que raios, vamos começar a tocar, o som está excelente. Eventualmente, damos de caras com músicos que foram nosso suporte há cerca de seis meses. Estavam a fazer uma festa e celebramos com eles. No backstage esvaziamos rapidamente uma garrafa de vodka. Fomos também dar uma olhada no Prison Bar: cerveja, miúdas, rock & roll. Merda, tarde de mais. O clube de strip estava fechado.

O Hotel Fountaine tinha estilo. Tinha uma entrada espaçosa, decorada com bom gosto em tons de vermelho escuro e dourado, telhas espanholas, tapetes persas, sofás e esculturas egípcias. As camas eram king-size. Tomamos um duche para não perder a forma. Até amanhã.

09/10/09 - Sexta-feira

Dia de folga. Podemos dormir mais um bocado e relaxar. Para o pequeno-almoço: galinha e lasanha. À noite no Prison Bar: pizza, Led Zeppelin, mulheres nuas, danças de mesa, cerveja e Jägermaister, pessoal doente a dançar bêbedo, rock & roll.

10/10/09 - Sábado

Despedimo-nos do agente Edgar, o anfitrião Louie e sua esposa. Seis horas de viagem até Vilnius, capital da Lituânia, eleita capital da cultura este ano. Vamos a caminho do último concerto desta digressão. Visitamos o BIX, um agradável pub, situado no centro histórico da cidade. Pelas colunas sai britpop. Será possível ouvirmos pop holandês também? Comida e bebida à discrição, fixe! Tivemos um surpresa: a Sabina visita-nos com seus amigos. É uma grande fã dos Cilice. Passámos três noites com ela em Kaunas na anterior digressão, a 150 km de Vilnius.

O concerto corre-nos bem. Pareceu-nos bastente coeso e compacto. Houve alguns interlúdios improvisados, mas foi deliberado. Socializar depois do espectáculo é coisa que nos agrada bastante, mas temos que manter os nossos planos. Conduzimos durante a noite. Esperamos evitar tráfego lento o mais possível, como tractores ou camiões, o que tememos, principalmente na Polónia com as suas longas estradas de um sentido apenas.

11/10/09 - Domingo

De regresso a casa. Não paramos pelo caminho. Por volta das 17h00 já estamos rodeados de estações de serviço, anúncios em neon desesperadamente a tentarem chamar-nos a atenção, placas com o preço dos combustíveis, zonas de camionistas, hotéis, outdoors referenciando clubes de sexo, prostitutas ao longo da estrada... Chegamos à fronteira da Polónia com a Alemanha. Pelas 23h00 chegamos a casa – Amesterdão - ao fim de quase duas semanas fora de casa e 7000 quilómetros percorridos. Terminamos mais uma aventura que valeu bem a pena. Na primavera de 2010 planeamos uma nova digressão por essas bandas.

Theo Holsheimer [Cilice]

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